A importância de conhecer seu perfil profissional para abrir um negócio.

Conhecê-lo ajudará na sua carreira e também nas ideias para um negócio próprio, se você quiser abri-lo algum dia.

 O teatro e o cinema sempre encantaram a goiana Lara Morena. Ela queria ser atriz e fez faculdade de artes cênicas. Ao sair, deparou com um mercado nada promissor. Em vez de abandonar o sonho de lidar com arte e cultura, criou um negócio próprio. Fundou a Matuto Cultural, empresa que organiza documentos e capta recursos para projetos culturais. Tirou a burocracia da frente de diretores, atores, produtores e músicos, ao permitir que eles se concentrem só em fazer arte. “Sinto-me realizada em ajudar essas pessoas”, diz.

 


Lara Morena (Foto: Cristiano Borges/ÉPOCA)
O roteiro seguido por Lara mostra traços peculiares de como lida com o trabalho, em geral, e com a criação de um negócio próprio, em particular. Ela é uma “idealista” – dá prioridade total à satisfação, sente prazer em ajudar os outros e não busca o máximo de retorno financeiro. É um dos seis perfis profissionais usados pela Endeavor, uma ONG que atua em rede em 21 países, dedicada a incentivar a criação de empresas. Em 17 anos de atuação no mundo, a Endeavor avaliou cerca de 40 mil empreendedores. No Brasil, trabalhou entre março e julho, a fim de definir os perfis. Como cada um está associado a pontos fortes e fracos, conhecê-los é um exercício útil a todos, mesmo para quem ainda não pensa em abrir um negócio. O consultor de carreira Eduardo Ferraz recomenda essa autoanálise e sugere um jeito de aproveitá-la: distinguir os pontos fracos dos que são apenas limitantes. “Os pontos fortes são o que você faz bem sem se esforçar”, diz. “Os pontos fracos são os que você não faz bem, mesmo que se esforce. Chamo de limitantes os que podem e precisam ser aprimorados para um bom desempenho no trabalho. Sugiro dedicar 70% do tempo a explorar os pontos fortes e 30% aos limitantes.” Segundo ele, um assalariado pode usar o emprego como escola para um futuro negócio próprio. “Trabalhe na empresa como se ela fosse sua. Conheça os números, as estratégias de venda, fique atento a todos os setores”, afirma.
O trabalho da Endeavor ocorreu em duas etapas. A partir da experiência acumulada de avaliar empreendedores no Brasil, a equipe selecionou e entrevistou 33 donos de negócios em diferentes estágios. Depois, fez um levantamento de opinião, com um teste pela internet. Participaram 4 mil pessoas com mais de 16 anos, empreendedores ou não, em 14 capitais. “Sempre tivemos uma inquietação com a diversidade das reais motivações dos empreendedores”, diz Juliano Seabra, diretor da Endeavor. “Com o estudo, queremos conhecer melhor o brasileiro que quer ter ou já tem um negócio próprio e encontrar os ‘gatilhos’ que levam cada um adiante.” O presidente nacional do Sebrae, Luiz Barretto, considera importante esse tipo de pesquisa. “Cada perfil tem demandas, expectativas, problemas e deficiências específicos a superar”, diz.


Em linhas gerais, os seis perfis, apresentados ao longo desta reportagem, indicam o cidadão que 1) deseja ter um negócio para trabalhar de seu próprio jeito; 2) segue os passos da família; 3) quer empreender desde criança; 4) não pensa seriamente em ter o próprio negócio; 5) segue seus ideais; e 6) dá prioridade total a ganhar dinheiro. Assim como em Lara, a idealista de Goiânia, os traços dos perfis se misturam em cada indivíduo. Ninguém é um “idealista” puro. O rótulo denota a predominância de algumas características. O levantamento de opinião da Endeavor não tem rigor estatístico para que as conclusões sejam aplicadas à população inteira. Mas dá pistas relevantes sobre como o brasileiro pensa no assunto.

 
Braulio Correa (Foto: João Marcos Rosa/Nitro/época)
O perfil mais comum entre os empreendedores se define por um desejo: “Quero meu milhão”. O principal objetivo deles é o lucro, e eles correspondem a um quarto dos que já empreendem. Para esse grupo, vale abrir uma fábrica de palitos de dente e, ao mesmo tempo, investir numa franquia de farmácia. Assim é Braulio Correa, de Belo Horizonte. Dono da Tatic, empresa de tecnologia da informação que compacta grandes volumes de dados na internet, ele diz que passa o tempo todo pensando em como ganhar mais dinheiro. “Autonomia financeira me trará autonomia de vida. Terei mais tranquilidade para trabalhar melhor, e isso se reflete nas pessoas ao meu redor”, diz. Esse grupo tende a funcionar em regime de urgência e considera-se mais produtivo assim. Beneficia-se por identificar oportunidades mais facilmente. “Se conseguir ganhar e guardar dinheiro com a primeira oportunidade que vê, esse tipo de profissional consegue identificar e explorar outras oportunidades que apareçam no meio do caminho”, diz Luiz Fernando Garcia, psicoterapeuta e consultor de negócios e recursos humanos. É o segmento mais jovem dos pesquisados. Coincide com a tendência de queda na média de idade dos empreendedores brasileiros. “Os jovens de até 25 anos têm muito potencial, em geral estão mais otimistas e se envolvem facilmente nas discussões sobre como criar negócios”, diz Rodrigo Paolilo, presidente da Confederação Nacional dos Jovens Empresários (Conaje).
Os mais ambiciosos são um quarto dos que participaram e também um quarto dos empreendedores
O perfil oposto ao da turma que quer o milhão é o idealista. Corresponde a 13% dos participantes. Um empreendedor idealista precisa perceber como seu negócio tem efeitos positivos no mundo ou num grupo específico. Tales Andreassi, coordenador do centro de empreendedorismo da FGV-SP, diz que o brasileiro ainda tem dificuldade em associar o empreendedorismo com a busca por uma sociedade melhor (por isso, entre os que não empreendem, os  idealistas se destacam no desinteresse por abrir o próprio negócio; ficam em segundo lugar nesse quesito). Andreassi recomenda que o idealista pense no negócio como um meio para um objetivo. O meio tem de funcionar de forma competente e profissional, ou o objetivo idealista não será atingido.

 
Bruno lopes (Foto: Marcelo Min/Fotogarrafa/ÉPOCA)
O segundo perfil mais frequente no estudo, em que se enquadrou um quinto dos participantes, é o “empreendedor nato”. Para entender esse tipo de cabeça, basta observar Bruno Lopes, de São Paulo. Pensava desde adolescente em abrir um negócio. Formou-se em engenharia, trabalhou numa empresa do setor de siderurgia, passou por diversas posições e, dois anos depois, abriu uma empresa de comércio exterior. Três anos depois, abriu outro negócio, a Confraria Beer Soap, uma pequena fabricante de sabonetes artesanais, cuja principal matéria-prima é cerveja. Garcia afirma que o empreendedor nato costuma gostar desde a infância das sensações de ganho e experimentação. Mas experimentar demais também pode se tornar um mau hábito. Para conter um novidadeiro frenético, vai bem um sócio ou braço direito pragmático e realista. Entre os que ainda não empreendem, o levantamento da Endeavor constatou que empreendedores natos tendem a figurar em cargos altos. É o perfil de quem cria novos negócios, mesmo como assalariado.
Welington Desan (Foto: Guilherme Pupo/ÉPOCA)
O perfil oposto a esse é quem nunca pensou em empreender – o situacionista. Pode-se supor que os participantes do estudo, voluntários, tenham interesse pelo tema ao menos igual ao resto da população ou, mais provavelmente, maior. Mesmo assim, uma grande parcela, um terço, caiu nesse perfil. É o sujeito que só toma a iniciativa de criar uma empresa se uma oportunidade cair em seu colo. Não é à toa que, entre os que já empreendem, menos de um décimo seja situacionista. Entre eles está Welington Desan, de Curitiba. “Numa reunião, um cliente gostou tanto de minha ideia que sugeriu que eu empreendesse. Nunca pensara nisso”, afirma. O chefe concordou. Desan mostrou competência ao ter a boa ideia, mas também contou com dois empurrões: do cliente e do chefe. Em três meses, abriu a Radek System, uma empresa de software para incentivar o consumo consciente de energia. A Endeavor associa a alta incidência desse perfil também a outro fato: quase três em cada quatro participantes darem prioridade à qualidade de vida, em detrimento da superação pessoal. Trata-se de uma opção saudável, mas facilmente associável à baixa ambição e à expectativa de crescimento menor das microempresas no Brasil, em comparação com as registradas em outras grandes economias.

A cautela é uma vantagem dos situacionistas, mas eles podem cair no comodismo. O perfil se destaca em situações que exijam calma e prudência. Precisa se esforçar para ficar atento a mudanças de cenário. A existência de empreendedores situacionistas combina com uma tendência em alta no Brasil. Até o início dos anos 2000, a maior parte dos empreendedores agia por necessidade. Hoje, 71% dos novos negócios nascem de oportunidade – é gente que poderia ter continuado em outro rumo profissional, mas aproveitou as circunstâncias, como Desan.
Juliana Blau (Foto: Camila Fontana/ÉPOCA)
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O terceiro perfil mais comum entre os empreendedores (17%) poderia ter como lema “do meu jeito”. Não se preocupa tanto com beneficiar o mundo e os outros, como os idealistas, nem pensa tanto em dinheiro. Incomoda-se por não encontrar no mercado uma empresa ou serviço que funcione como ele quer. Juliana Blau, dona da galeria de arte Blau Projects, sentiu isso. Filha de dono de galeria de arte, chegou a trabalhar com o pai. Falou mais alto a vontade de conduzir as coisas a seu modo. O pai procurava artistas consagrados, ela queria  novidades. “Nem pensei em trabalhar noutra galeria. Queria construir algo com a minha visão”, afirma. Para o consultor Ferraz, empreendedores como Juliana vicejam ao enfrentar obstáculos e ao encontrar receitas próprias. “Tendem a ser empreendedores de nicho, sem a pretensão de oferecer produtos e serviços para todo mundo”, diz Ferraz, autor do livro Seja a pessoa certa no lugar certo. Os adeptos da filosofia do “meu jeito” podem sofrer por não encontrar parceiros profissionais que entendam e apreciem seu estilo. As mulheres são maioria nesse perfil. A constatação combina com a expressiva criação de negócios, nos últimos anos, por mulheres. Hoje, respondem pela maior parte das empresas (52%). Geraldo Borin, professor de empreendedorismo na PUC-SP, diz que todo empreendedor tem de aproveitar características normalmente atribuídas a mulheres – adaptabilidade, boa organização e gosto por trabalhar em equipe. Entre os não empreendedores, os indivíduos com esse perfil também afirmam pretender abrir um negócio em até cinco anos, assim como a maioria dos empreendedores natos e da turma que quer o milhão.

Sérgio Lomachinsky (Foto:  Leo Caldas/ÉPOCA)

A motivação de Juliana para abrir sua própria galeria – “quero fazer do meu jeito” – a distingue do pessoal do perfil oposto, os “herdeiros”. Eles são 13% dos participantes do levantamento Endeavor. Nasceram em famílias com negócio próprio. Sérgio Lomachinsky, do Recife, é filho de empresários – o pai é arquiteto, e a mãe professora de dança. Ele estudou engenharia eletrônica, fez pós-graduação em administração hospitalar e foi trainee num grande hospital paulistano. Achou um caminho normal fundar também sua empresa, a TecSaúde, que administra equipamentos hospitalares. Sua principal motivação, diferente de Juliana, foi obter autonomia, não criar algo distinto do que os pais fizeram. “Sou filho de empreendedores, mas ninguém acorda uma manhã e abre o próprio negócio. Me preparei, porque você precisa entender bem o que faz”, diz. Entre assalariados, também existem “herdeiros”. São os que seguem a tradição familiar e a escolha profissional dos pais, mesmo que não sejam donos de empresas. Todo herdeiro corre risco de perpetuar erros e vícios na forma de trabalhar e de ficar à sombra dos pais. Lomachinsky evitou a armadilha. Em todos os perfis, é possível seguir a definição mais essencial de empreendedorismo: criar algo novo.
fonte: http://epoca.globo.com/vida/noticia/2014/11/importancia-de-conhecer-seu-bperfil-profissionalb-para-abrir-um-negocio.html

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